Muitos
dos meus ideais não irão se concretizar por inteiro. Geração cheia de atitude,
a favor da diversidade e que desobedece aos estados de intensa razão. Não podemos negar as experiências que nos
aproximam do que realmente somos: loucos e lúcidos, sonhadores e vagantes.
No
encontro com o poeta, perco o tempo, as palavras, o espaço; perco também as
rédeas, saio do rumo e espremo o sumo de minha existência. Tudo vira ao avesso.
Foi assim que me lembrei de um tempo e de um velho amigo.
Um
poeta não lembrado e esquecido na esquina entre a rua da realidade e a avenida
da ilusão. Foi assim que decifrei Jojó, um poeta que acredito ser o poeta
cometa, um verdadeiro Alien do passado.
No
documento parece que tem Josieverson, mas no papel de poeta, músico,
compositor, mecânico e vendedor de limão, além de moto-taxista, ele é Jojó.
Vou
explicar melhor porque é um alienígena do passado. Um dia cheguei na casa da
minha mãe e na área estavam folhas de papel com escritos em garranchos. Antes
de pegá-los vi o nome de Jojó e abaixo a frase “Os Aliens do Passado”. Era o
nome da banda que formamos e fizemos uma única apresentação no evento anual do
Movimento Alternativo Goto Seco, em setembro de 2018. Sem ensaio, sem notas e
sem sobriedade, foi um ponto no holograma da arte do universo. Wellington posto
na guitarra, eu no baixo e JB na bateria. Na frente, Jojó testava a paciência
do mesário de som e muitos loucos na plateia vidrados nos movimentos
imprevisíveis, prontos para vibrarem numa loucura qualquer. Amores, bosta de
burro, cão estrela, profecias etílicas, mulheres, viagra e disritmias formou
uma poética digna de só uma apresentação! Foi bom ver o poeta transbordar,
gritar, agredir o vento, falar de suas perdas inexistentes naquele dia que fez
desaparecer o tempo e partiu a partitura.
Já
vi Jojó ser preso, mas nunca vi prenderem o poeta que carrega. Nunca perdeu a
loucura que anda pelo seu corpo, nem perdeu jamais a razão. Isso ele sempre
deixa em casa, bem guardada, pra não perder. Seus cachorros-amigos, o estrela e
o surfista, não o veem como dono, nem veem nele fronteiras, aceitando o absurdo
de dividir o churrasquinho com ele.
Jojó poetizou uma vez: “olhei para luz tão de repente que pensei que um mosquito passando fosse
uma estrela cadente”. Foi um caminho sem volta, foi uma saída de si, Uma
volta sobre a terra. Ou foi apenas uma embriaguez?! Tanto faz, pois embriagado
ou lúcido a imaginação nunca abandona o poeta. Apenas se autogera, entropia da
mente, alimentada pelo que se sente, limitado ou não, em cada momento. É a
ilusão tão real da realidade que ilude o poeta. Foi assim que o universo
concebeu Jojó: o poeta da lucidez embriagante.
Então,
que fique claro: quem embriaga Jojó é a realidade que enjaula e a ilusão é a
realidade que lhe acolhe. Sua poesia vem do esquecimento do mundo e, ao mesmo
tempo, vem da lembrança que devemos existir e isso às vezes cabe numa dose, mas
em outras ocasiões, parece que não cabe no mundo. O que o real nos faz a não
ser usar a ilusão para nos protegermos dela mesmo?! Qual o sentido de poder ser
e não saber que já sou? O que pode ser pior do que ter poesia, este vasto
oceano, e não poder navegar?
Em
Setembro de 2001, na primeira edição do jornal
alternativo Folha Delta, feito em Ceará-Mirim, Jojó publicou o poema:
Estou vivendo tentando não
morrer
E procurando no tempo a razão
do meu viver
Será que é beber?
Será que é amar você?
O será simplesmente morrer?
Colocam
Jojó numa bolha da loucura, nesse limitado normal, mas Jojó é mais. Ele
transcende a loucura de forma racional, construindo verdades em cada esquina
que passa, tirando a roupa, quebrando copos, subindo na mesa e dando tragos.
Vai fumando os caretas que lhe enquadram, um por um.
Nas folhas que encontrei jogadas na área da
minha mãe tem letras, composições e mais nada além de poesias. Mas o que poucos
sabem é seu segredo. O que o faz decifrar a vida, essa realidade ilusória, fria
e solitária é uma luneta mágica. Acontece como no livro A Luneta Mágica, de Joaquim
Macedo, onde Simplício vê maldades, descumpre regras e depois o bem aparece nas
pessoas, mas que passam a lhe enganar, fazendo-o mudar de rumo na vida. Seria a
poesia a luneta mágica de Jojó? Só ele sabe. Só sei desse grande poeta na vida. Bravo, Jojó!
Cadu
Araujo (Poeta e educador)
Imagens do autor
Para o Movimento Alternativo
Goto Seco
Ceará-Mirim, 21/05/2020
Cada um de nós tem uma história curiosa sobre essa icônica figura, sem dúvida é mecedor dessa homenagem, mas seu estilo de vida degradante e o que nos preocupa...
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